O Sapato deu um chute na Pedra e gritou de dor.
- Aiaiai! Uiuiui! Porque não olhas onde anda?!!
A Pedra, sonolenta, abriu um olho e depois o outro.
- O quê? Quem me acordou do meu sono de pedra?
O Sapato pulava ao redor da Pedra, gemendo.
- Aiaiai, que pedra dura, tanto bate até que me fura!
A Pedra, acostumada com tantas reclamações por estar no meio do caminho nem pestanejou.
- Não és o primeiro que topa comigo, não imaginas quanto tênis, chinelo e até dedão do pé já ficou assim, pulando â minha volta...
- Uiuiui, porque não vais pra aquele lugar, na beira do caminho, então?
- Do jeito que me chutam, mais uns séculos e logo estarei lá...
- Desde quando estás aí, atrapalhando o tráfego?
Ah, Sapato, desde que o mundo é mundo!
Então és muito velha, tens a idade da pedra - zombou o sapato.
- Sim, e tu, como te chamas? - perguntou a Pedra tentando acalmar o Sapato.
- Sapato Raimundo, a seu dispor, já dei a volta ao mundo - apresentou-se orgulhoso o bom sapato.
- Olha, até rimou! Agora me lembraste de um poeta que um dia também topou comigo.
- Quem era o poeta?
- Acho que era Calos Dumundo de Andares, ou algo parecido...
Moral do apólogo: até pedra e sapato tem sua poesia.
Porto Alegre, 23 de dezembro de 2020.
Imagem: caricatura de Drummond, Google
edu cezimbra
Nenhum comentário:
Postar um comentário