segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Formatura na "Belíndia"

“SE TU ÉS NEUTRO EM SITUAÇÃO DE INJUSTIÇA, TU ESCOLHESTE O LADO DO OPRESSOR”. 

DESMOND TUTU



"Belíndia" - quem é mais velho e politizado lembra desse neologismo empregado para designar o Brasil há uns 30 anos atrás.

Explico: o Brasil é um país em que uma minoria desfruta de uma boa vida enquanto a maioria esmagadora de sua população vive na miséria.

Com a abrupta queda na miséria de 23 milhões de brasileiros, nos últimos 2 anos, ainda mais, com 1% da população açambarcando 30 % da renda nacional, volta a ser operativa essa noção do Brasil como uma "Belíndia".

Por dever de ofício fui a uma formatura de ensino médio de uma escola privada religiosa em Porto Alegre.

E o que me ocorreu depois de presenciar a formatura é que essas escolas fazem todos acreditar que seus filhos e parentes estão se formando na Bélgica... A "Índia" está bem ali perto, no lixo acumulado no canteiro da avenida, em que pessoas "habitam", mas não "interessa".

O "senso crítico" ensinado pela escola e tão propalado pela diretora da escola não aparece nem no discurso dos oradores das turmas nem no discurso da professora paraninfa.

Tudo gira em torno de "anedotas" e "momentos inesquecíveis" de uma família que é unida, embora brigue muito.

Os "momentos inesquecíveis" parecem intencionalmente esquecer a dura realidade da vida em um país iníquo e cruel com a maioria de seu povo.

Em poucas palavras, assim foi a formatura de "ensino médio", ou pior, de "ensino medíocre"  na "Bélgica" da qual fui testemunha.

"Estar ao lado dos pobres é evangelho, e não comunismo", apregoa o Papa Francisco, liderança máxima dessas congregações religiosas dedicadas ao ensino, mas acontece que elas estão mesmo ao lado dos ricos, ou melhor, da classe média branca.

Esse é outro "detalhe" que impressiona: nenhum negro entre os formandos. A maioria loira, alta, orgulhosos descentes de europeus - ainda com pompa de colonizadores -, embora colonizados.

A conclusão a que se chega é que uma escola privada de ensino religioso não toca nestas questões "melindrosas" para não afastar seus futuros "clientes" e potenciais opressores do povo pobre e oprimido deste país.


Ainda hoje de manhã compartilhei essa nota à imprensa do "ÓI Nóis Aqui Traveiz", da década de 80 (atualíssima), citada pela amiga Sandra Alencar, em seu livro "Atuadores da Paixão":

"Os pretensos defensores da doutrina cristã consideram imoral o corpo nu de um ator numa manifestação, mas defendem a imoralidade das taxas exorbitantes que geram lucros cada vez maiores para sua instituição".

Meu caro e raro leitor, perdoe-me o tom panfletário dessa crônica, mas entenda como um desabafo particular desse "leitor metido a escritor", que não deixa passar em branco cenas tão patéticas quanto deploráveis.


Porto Alegre, 18 de dezembro de 2017.

Imagem: Google

Edu Cezimbra

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