Ao invés da lata d'água na cabeça levava uma trouxa de roupa lavada no Porto dos Aguateiros do rio Ibirapuitã.
Era uma negra magra, alta e sua elegância natural era reforçada pelo andar ereto para equilibrar a trouxa de roupa na cabeça.
Tinha que caminhar muito da sua modesta casa ao lado dos trilhos do trem para Quaraí até as margens rochosas do rio.
Não esqueço o seu sorriso amigo quando passava em frente ao bolicho do meu pai, no Alegrete, carregando na cabeça a trouxa de roupa lavada, cuidadosamente empilhada.
Não lembro o nome dessa senhora, mas recordo que todos a conheciam pejorativamente como "a batuqueira" da rua.
À noite, depois de lavada e passada a roupa dos fregueses, virava a sacerdotisa da sua religião e os tambores do batuque ecoavam pelos céus, quebrando a monotonia da pacata cidade do interior.
Lamento nunca ter entrado na sua casa de religião para conhecer de perto esta religião afro-gaúcha que mantém viva a tradição dos orixás no sul do Brasil.
Hoje, aprendi a respeitar e valorizar essa herança espiritual da humanidade que venera as forças da natureza de uma forma tão original.
Fica a lembrança boa do olhar carinhoso e o sorriso largo desta sacerdotisa do Batuque gaúcho que honrava Oxum nas águas doces do rio Ibirapuitã.
Porto Alegre, 19 de junho de 2020.
Imagem: Lavadeiras, Cândido Portinari, Google
Edu Cezimbra
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