No Brasil é 'Dia dos Finados', uma maneira cerimoniosa de nomear os 'falecidos', ou melhor, os mortos: o 'finado Fulano de Tal', o 'finado meu avô', a 'finada minha tia'.
Diferente do México, que nesse dia faz um barulhento carnaval com visitas e 'velórios' nos túmulos dos familiares, levando comida e bebida para seus mortos, no que denominam 'Dia de Los Muertos'.
Não tenho a menor ideia de onde se origina essa forma tão obtusa de lidar com a morte no Brasil.
Até parece que os mortos são culpados por...morrerem.
Pensando bem, não difere muito de quem tem um câncer.
Talvez aí, uma pista desse mistério brasileiro: a negação do câncer (epidêmico) e da morte.
Lembro que quando guri tinha um medo danado de tudo que se relacionasse com a morte.
Passava do outro lado do da rua, sem olhar para os 'caixões de defunto' (outro jeitinho brasileiro de chamar o morto) da 'armadoria' (funerária) perto de casa.
O 'pano preto' na frente da casa onde se velava o morto também era de arrepiar, assim como todo o aparato do velório que se estendia noite a dentro.
Outro pavor que tinha era de ser enterrado, vivo ou morto; imaginava como seria horrível ficar fechado em um caixão enterrado em uma cova ou emparedado em um cemitério.
E o drama não acabava com o enterro do finado, não...muito pelo contrário.
Havia um longo período de luto familiar onde o viúvo ou viúva se fardava de preto e assim circulavam pelas ruas da cidade com o rosto lamurioso de quem sofria uma dor irreparável.
A presença de um familiar do morto em uma festa era motivo de falatório na vizinhança, que dirá dar uma festa, estas estavam adiadas até o final do longo período obrigatório de luto.
Para ter uma ideia do interdito basta ir ao Teatro Colón, em Buenos Aires, e verificar os furos nas paredes, perto do palco, que eram usados pelas viúvas ricas para assistirem suas óperas preferidas sem se exibirem em público.
Acho que a diferença básica entre o México e o Brasil é a maneira de encarar a Morte.
No Brasil, a morte é vista como uma derrota tão abominável quanto o câncer.
Já no México a Morte tem uma conotação de celebração...da vida, assumindo 'La Muerte' como uma dimensão do mundo dos vivos.
Ou seja, há uma aceitação da Morte e de seus inexoráveis seguidores, que somos todos nós, os vivos e os mortos...
Fernando Pessoa assim cantou a Morte:
A morte é a curva da estrada,
Morrer é só não ser visto.
Se escuto, eu te oiço a passada
Existir como eu existo.
A terra é feita de céu.
A mentira não tem ninho.
Nunca ninguém se perdeu.
Tudo é verdade e caminho.
Porto Alegre, 2 de novembro de 2016.
Foto: "Jarro preto e caveira", de Pablo Picasso
Edu Cezimbra
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